Voltem os ciganos
Miguel Esteves Cardoso - 12-09-2010-In Público
Em São Pedro do Estoril, mesmo ao pé da estação de comboios, havia um campo aberto onde os ciganos acampavam. Antes ou depois do 25 de Abril - pouco interessa - esse campo passou a terreno e foi vendido e transformado em apartamentos e lojas.
Eu e o meu irmão, quando éramos adolescentes, tivemos a sorte de termos amigos ciganos, que engraçaram connosco e nos ensinavam coisas, faziam-nos rir e, sobretudo, protegiam-nos.
Por toda a parte havia estes campos, onde os ciganos podiam viver o tempo que quisessem, fazer festas e casamentos sem fim e armar barracas no sentido literal ou metafórico. Enriqueciam a nossa vida. Vestiam-se bem; tinham honra e dignidade; sabiam dançar. Eram um bocadinho elitistas, achando-se melhores do que nós, mas não eram proselíticos. Aceitavam-nos (e até achavam graça à maneira) como nós éramos - não queriam converter ninguém, mas também não nos excluíam da sabedoria deles.
É uma grande vergonha para a raça humana e para a civilização europeia - a começar pela Roménia e a continuar, inaceitavelmente, na Itália e em França - que não se respeitem os ciganos, não só como cidadãos europeus, mas como ciganos.
Os ciganos são como os anarquistas ou os hippies ou os ateus. Não podem ser expulsos. Sendo nómadas e apátridas, não podem ser fixados ou repatriados. São uma nação fluida, de muitas famílias.
São a nossa salvação e tê-los entre nós lembra-nos que somos livres, caso tivermos a coragem de pensar nisso.

3 comentários:
É uma vergonha a expulsão, sim. Mas já não embarco nessa defesa acérrima dos valores dos ciganos. Não é por eles que sei que sou livre.
Regressei há pouco mais de 24h de Jerusalém, onde vivi uma experiência de fé muito forte, mas também uma experiência terrivelmente dolorosa sobre o que é a exclusão, o proselitismo, a separação de povos e religiões, em que a política se afirma com muros e arames farpados. "felizes os que têm fome e sede de justiça...", "felizes os mansos, porque possuirão a terra".
Que o Senhor nos ajude a olhar todos os homens como irmãos, sem excepção de raça ou religião, para que sejamos fontes de PAZ na Terra.
Revejo-me no texto. Vivi em criança amizade com ciganos e fui feliz.
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