Da mesma forma que escolheu a ilha de Lampedusa e o drama da imigração para transformar
sua primeira viagem apostólica em um libelo contra a "globalização da indiferença",
o papa Francisco quis que sua primeira encíclica própria - a anterior havia sido
escrita na maior parte por Bento XVI - se transforme em uma defesa apaixonada da ecologia.
A reportagem é de Pablo Ordaz, publicada pelo jornal El País, 03-01-2015.
Segundo fontes do Vaticano, a encíclica na qual Jorge Mario Bergoglio e um grupo
significativo de assessores - entre os quais se destacam o cardeal ganense
Peter Turkson e os teólogos argentinos Carlos María Galli e Víctor Manuel
Fernández - vêm trabalhando desde o outono de 2013 está praticamente pronta
e poderá ser publicada ainda este mês. O papa nunca escondeu sua enorme
preocupação diante do que considera um dos maiores desafios da humanidade,
"a custódia da criação e a ecologia".
Já não resta qualquer dúvida de que o jesuíta Bergoglio, quer esperasse ou
não ser eleito papa depois da renúncia de Joseph Ratzinger, tinha muito claro
desde o primeiro dia seu projeto de igreja. Não só porque os primeiros deslocamentos
escolhidos por ele - as ilhas de Lampedusa e Sardenha - quisessem encenar a viagem
para as periferias da imigração e do desemprego, mas porque já na primeira missa
de inauguração do pontificado, em 19 de março de 2013, salientou a importância
de "custodiar a natureza".
Na ocasião, o pontífice chegou a dizer que Francisco de Assis, em cujo nome e mensagem
inspiram seu papado, representa o modelo de vida austero, respeitoso com a criação, tão
distante da atual "conjuntura do descarte", por culpa da qual em alguns países se
desperdiça de forma caprichosa alimentos e recursos naturais, enquanto em outras latitudes
milhões de pessoas morrem de fome. Só cuidando da natureza, advertiu o papa, é possível
também "custodiar as pessoas, preocupar-se com todos, especialmente as crianças,
os idosos e os mais frágeis".
Desde aquele dia, foram muitas as referências de Francisco à proteção da natureza,
tanto ao longo de suas viagens como nas audiências na Praça de São Pedro.
Em maio passado, diante de cerca de 100 mil peregrinos vindos do mundo todo,
Bergoglio advertiu: "A natureza não é uma propriedade da qual podemos abusar à vontade,
muito menos é a propriedade de alguns poucos, e sim um dom de todos, que devemos custodiar.
Se destruirmos a criação, a criação nos destruirá. Nunca se esqueçam disso!"
O papa usou em diversas ocasiões um ditado popular: "Deus perdoa sempre, os homens
algumas vezes, a natureza nunca". E em julho passado declarou: "Estamos destruindo
a criação.
Matamos a natureza sem percebermos que estamos ficando com um deserto, e não
com um jardim". O pontífice admitiu que estava escrevendo uma encíclica que
poderia ter o nome de "A ecologia da humanidade".
Embora por pessoas intermediárias, no Vaticano logo se soube que Jorge Mario Bergoglio
havia decidido que a primeira encíclica de seu punho e letra - a anterior, "A luz da fé",
publicada em julho de 2013, pertencia em sua maior parte a Ratzinger - se concentraria
na relação do homem com a natureza. Já em fevereiro passado, monsenhor Federico
Lombardi, porta-voz do Vaticano, confirmou que o papa assim havia comentado
ao presidente francês, François Hollande.
Diversas personalidades do mundo religioso - entre elas o bispo austríaco Erwin Kräutler,
missionário há 50 anos na Amazônia brasileira, e a ministra-geral da Ordem Franciscana
Secular, Encarnación del Pozo - afirmaram que o papa as consultou antes da redação
de sua circular ao mundo católico. Mas a verdade é que o núcleo central da encíclica
foi escrito entre Roma e Buenos Aires.
O papa quis que a parte doutrinária fosse sustentada pelos dois responsáveis máximos
do Pontifício Conselho para a Justiça e a Paz, seu presidente, o cardeal ganense
Peter Turkson, 66, e seu secretário, o bispo italiano Mario Toso, 64, um prestigioso especialista em teologia e filosofia, embora "demasiado progressista" para alguns membros
do Vaticano.
A parte expositiva também foi redigida por duas das pessoas mais próximas de Bergoglio,
o arcebispo Víctor Manuel Fernández, reitor da Pontifícia Universidade Católica da
Argentina, e o sacerdote Carlos María Galli, doutor em teologia. Segundo uma fonte
conhecedora da encíclica, esta será "mais uma bomba midiática" no mais puro
estilo Bergoglio. Isto é, aumentará o consenso mundial em torno de sua autoridade moral,
enquanto os setores mais tradicionais do Vaticano continuarão a observá-lo
com certa inquietação.
sua primeira viagem apostólica em um libelo contra a "globalização da indiferença",
o papa Francisco quis que sua primeira encíclica própria - a anterior havia sido
escrita na maior parte por Bento XVI - se transforme em uma defesa apaixonada da ecologia.
A reportagem é de Pablo Ordaz, publicada pelo jornal El País, 03-01-2015.
Segundo fontes do Vaticano, a encíclica na qual Jorge Mario Bergoglio e um grupo
significativo de assessores - entre os quais se destacam o cardeal ganense
Peter Turkson e os teólogos argentinos Carlos María Galli e Víctor Manuel
Fernández - vêm trabalhando desde o outono de 2013 está praticamente pronta
e poderá ser publicada ainda este mês. O papa nunca escondeu sua enorme
preocupação diante do que considera um dos maiores desafios da humanidade,
"a custódia da criação e a ecologia".
Já não resta qualquer dúvida de que o jesuíta Bergoglio, quer esperasse ou
não ser eleito papa depois da renúncia de Joseph Ratzinger, tinha muito claro
desde o primeiro dia seu projeto de igreja. Não só porque os primeiros deslocamentos
escolhidos por ele - as ilhas de Lampedusa e Sardenha - quisessem encenar a viagem
para as periferias da imigração e do desemprego, mas porque já na primeira missa
de inauguração do pontificado, em 19 de março de 2013, salientou a importância
de "custodiar a natureza".
Na ocasião, o pontífice chegou a dizer que Francisco de Assis, em cujo nome e mensagem
inspiram seu papado, representa o modelo de vida austero, respeitoso com a criação, tão
distante da atual "conjuntura do descarte", por culpa da qual em alguns países se
desperdiça de forma caprichosa alimentos e recursos naturais, enquanto em outras latitudes
milhões de pessoas morrem de fome. Só cuidando da natureza, advertiu o papa, é possível
também "custodiar as pessoas, preocupar-se com todos, especialmente as crianças,
os idosos e os mais frágeis".
Desde aquele dia, foram muitas as referências de Francisco à proteção da natureza,
tanto ao longo de suas viagens como nas audiências na Praça de São Pedro.
Em maio passado, diante de cerca de 100 mil peregrinos vindos do mundo todo,
Bergoglio advertiu: "A natureza não é uma propriedade da qual podemos abusar à vontade,
muito menos é a propriedade de alguns poucos, e sim um dom de todos, que devemos custodiar.
Se destruirmos a criação, a criação nos destruirá. Nunca se esqueçam disso!"
O papa usou em diversas ocasiões um ditado popular: "Deus perdoa sempre, os homens
algumas vezes, a natureza nunca". E em julho passado declarou: "Estamos destruindo
a criação.
Matamos a natureza sem percebermos que estamos ficando com um deserto, e não
com um jardim". O pontífice admitiu que estava escrevendo uma encíclica que
poderia ter o nome de "A ecologia da humanidade".
Embora por pessoas intermediárias, no Vaticano logo se soube que Jorge Mario Bergoglio
havia decidido que a primeira encíclica de seu punho e letra - a anterior, "A luz da fé",
publicada em julho de 2013, pertencia em sua maior parte a Ratzinger - se concentraria
na relação do homem com a natureza. Já em fevereiro passado, monsenhor Federico
Lombardi, porta-voz do Vaticano, confirmou que o papa assim havia comentado
ao presidente francês, François Hollande.
Diversas personalidades do mundo religioso - entre elas o bispo austríaco Erwin Kräutler,
missionário há 50 anos na Amazônia brasileira, e a ministra-geral da Ordem Franciscana
Secular, Encarnación del Pozo - afirmaram que o papa as consultou antes da redação
de sua circular ao mundo católico. Mas a verdade é que o núcleo central da encíclica
foi escrito entre Roma e Buenos Aires.
O papa quis que a parte doutrinária fosse sustentada pelos dois responsáveis máximos
do Pontifício Conselho para a Justiça e a Paz, seu presidente, o cardeal ganense
Peter Turkson, 66, e seu secretário, o bispo italiano Mario Toso, 64, um prestigioso especialista em teologia e filosofia, embora "demasiado progressista" para alguns membros
do Vaticano.
A parte expositiva também foi redigida por duas das pessoas mais próximas de Bergoglio,
o arcebispo Víctor Manuel Fernández, reitor da Pontifícia Universidade Católica da
Argentina, e o sacerdote Carlos María Galli, doutor em teologia. Segundo uma fonte
conhecedora da encíclica, esta será "mais uma bomba midiática" no mais puro
estilo Bergoglio. Isto é, aumentará o consenso mundial em torno de sua autoridade moral,
enquanto os setores mais tradicionais do Vaticano continuarão a observá-lo
com certa inquietação.
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