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terça-feira, 16 de julho de 2013

Lumen fidei A novidade de uma encíclica

Comecemos por sacudir equívocos. O primeiro é o de pensar que uma encíclica sobre a fé destina-se a ser acolhida dentro da cerca eclesial, e aí só, como se ela não constituísse um texto de enorme importância para a cultura ou para a sociedade no seu conjunto. 

O segundo é a consideração de que a relevância do discurso cristão se esgota nos pronunciamentos ditos sociais: o Papa Francisco ir ao desembarcadouro de Lampedusa, reclamar corajosamente por políticas mais humanas, colhe o interesse geral, mas propor, com igual desassombro, uma reflexão sobre o sentido da fé, isso já é olhado como minudência descartável.

Ora, a discussão sobre a fé, e sobre a irreverente singularidade da fé cristã, é um assunto de cidade, como já amplamente o provou o apóstolo Paulo, que deslocou esse debate do interior das sinagogas para areópagos, escolas de filosofia, teatros e cantos de estrada o debate sobre a essência do cristianismo precisa urgentemente de reencontrar a sua natureza pública.

Em seguida, há que reconhecer que esta encíclica representa, por si mesmo, um caso, embora longe de se reduzir a ele. Quando o Papa Bento XVI decidiu escrever um tríptico sobre as chamadas virtudes teologais (fé, esperança e caridade), esperava-se que tivesse começado pela fé. Mas, de facto, isso não aconteceu: a sua encíclica de estreia foi uma lição sobre a caridade. 

Antes da sua renúncia, em Fevereiro deste ano, voltou-se a falar insistentemente em que ele estaria a preparar finalmente a encíclica sobre a fé, mas os tempos precipitaram-se e nada veio a lume. Seria já o Papa Francisco a aceitar esta empresa «a quatro mãos»: partir de um primeiro esboço de encíclica que Bento XVI tinha «quase concluído» e acrescentar «uma ou outra nova contribuição». 

No fundo, trata-se simplesmente de Pedro (Bento, Francisco ou qualquer outro nome que venha a ter) «a confirmar os irmãos no tesouro incomensurável da fé».
Qual o resultado? Um texto de enorme espessura e novidade, podemos dizê-lo, e que seria pena se não suscitasse a hospitalidade cultural que merece. É que ele pratica essa hospitalidade, convocando para a sua elaboração dialógica, além dos textos das escrituras judaicas e cristãs, o pensamento de filósofos (esperados, como Agostinho ou Tomás de Aquino; e inesperados, como Nietzsche, Rousseau, Wittgenstein), de poetas (Dante e T. S. Eliot), de escritores (Dostoievski), de teólogos antigos (Justino, Clemente de Alexandria, Leão Magno) e contemporâneos (Newman, Guardini ou Buber).

Mas qual é a novidade? A novidade é uma interpelação para o pensamento dominante. De facto, o racionalismo unilateral que vigora sente-se no direito de desautorizar o estatuto da fé. Na era da técnica, como aprenderemos a rezar? Quanto muito, e por uma condescendência especial, admite-se que a fé possa existir «como um salto no vazio, que fazemos por falta de luz e impelidos por um sentimento cego», sem nenhuma objectividade.

O que a encíclica "Lumen Fidei" (Luz da Fé) defende é precisamente contrário: a fé não é uma tábua de salvação irracional a que nos agarramos, uma via de penumbra por onde enveredamos para escapar ao desespero a que somos expostos. 

A fé cristã é luz. Isto é: não há incompatibilidade entre fé e razão, mas ambas se reforçam mutuamente. O cristianismo bebe tanto na revelação dos profetas de Israel como na sabedoria de procura testemunhada pelos filósofos gregos. Aliás, como recorda a encíclica, «o encontro da mensagem evangélica com o pensamento filosófico do mundo antigo constituiu uma passagem decisiva para o Evangelho chegar a todos os povos e favorecer uma fecunda sinergia entre fé e razão». 

Como não há incompatibilidade entre fé e verdade. Aliás, uma verdade que não englobasse a fé (como experiência ou, pelo menos, como possibilidade) seria uma verdade incompleta, incapaz de superar o efémero.

José Tolentino Mendonça
In Expresso, 13.7.2013

6 comentários:

vp disse...

No final, onde a razão não consegue chegar, e isso é um dado adquirido ao longo dos tempos humanos, fica-nos sempre a Fé como caminho derradeiro... e aqui, só nos resta clamar: SENHOR, AUMENTA A MINHA(nossa) FÈ..."

Abraços no Pai a todos...

vp disse...

"Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem." (Hb 11,1)

Maria-Portugal disse...

rs na Religião Digital diz q foi publicada para sossegar os conservadores...

vp disse...

Pobre do Irmão Francisco, ter que acabar uma encíclica que não era do seu punho!!!! Mas é muito boa sim... agora essa de "sossegar os conservadores." já me fez rir e bem...

... encontro amanhã com o Irmão pela tarde...

Santa tarde a todos...

Maria-Portugal disse...

Oremos...

Maria-Portugal disse...

e orei...mas nada sabemos do encontro..esperemos em Deus que mais luz tenha surgido.