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terça-feira, 16 de agosto de 2011

Assis... Peregrinações...II

Giotto

Ao olhar deslumbrado aqueles frescos de Giotto, recordei o gesto de Francisco de Assis, pedindo aos companheiros que o desnudassem e o colocassem na terra, naqueles derradeiros momentos da sua vida...

... e tudo voltou a acontecer em mim…

... e o meu coração regressou àqueles anos da Abadia....

.. aconteceu em duas ocasiões... fui acompanhar dois irmãos monges à sepultura do pequeno cemitério que ali existe, e que está situado por detrás do sacrário... tem só uma parede a separá-lo da capela principal. Não é por acaso… aqueles que ali já repousam, juntam-se aos outros irmãos do outro lado, que ainda andam a vadiar com a alma pelos claustros, no salmodiar no coro da Igreja e na celebração da Eucaristia…!

Uma das sepulturas, calhou-me essa experiência de serviço na caridade fraterna… 2 metros de profundidade… espaço não faltava ali… enquanto escavava, ia meditando na minha própria vida… um nome… podia ser o meu, porque não...! Fr. andarilho, (Frére), porque ali se fores Padre esse "casaco" que te vestiu a vaidade fica de fora, levas contigo apenas o Frére-irmão... escrito numa pequena cruz de alumínio branco liso… o teu corpo vestido com o hábito branco areia, com escapulário preto e cinturão de cabedal, embrulhado apenas num lençol (os monges da Trapa não usam féretro…), uma campa lisa sem nada sobre ela a não ser a terra e uma planta que ali será cuidada ao longo dos tempos por gerações de outros monges… o único desejo que poderia ter um monge, poder escolher uma roseira ou outra planta para a sua sepultura…!

Na Primavera, era lindo ver aquele jardim naquele pequeno cemitério da Abadia… também nesse pedaço de terra livre das cobiças humanas, exerci muitas vezes o ministério de irmão-jardineiro… só as formigas e os pardalitos que por ali passeavam e voavam entre os cedros enormes que ali dão sombra, conheceram os diálogos e as palavras que tantas vezes vivemos naquele espaço do silêncio dos silêncios, entre este andarilho monge e os meus irmãos que já repousavam…

Como eram...! De que falávamos…! São segredos de monge, peço perdão mas… risos…!
Perdoem-me o passeio da alma por esses anos que tanta recordação me trazem ao coração…

... regresso novamente ao local onde o Pobre de Assis deitado na terra, olha o firmamento…!

Como daria tudo no mundo para olhar através dos olhos de Francisco…! Cantar eternamente aquele Cântico das Criaturas e ali ficar, sentido a nudez da vida e o aconchego da terra que voltará um dia a abraçar e recolher em mim, o filho que dela brotou…! Poder como Francisco, chamar à terra de Irmã Terra… pedir-lhe que me agasalhe do frio deste mundo que ainda não percebeu a verdade que o sustenta… que nega espaço para que o outro meu irmão possa sorrir à vida… cantar livremente… como Francisco cantou… só almas livres, como a do Pobre de Assis, podem levar e cantar tamanha beleza e riqueza….
Cântico das Criaturas

Louvado sejas, meu Senhor
Com todas as tuas criaturas.
Especialmente o senhor irmão Sol
Que clareia o dia
E com sua luz nos ilumina
E ele é belo e radiante,
Com grande esplendor:
De ti, Altíssimo, é a imagem.
Louvado sejas, meu Senhor
Pela irmã Lua e as Estrelas
Que no céu formastes claras
E preciosas e belas.
Louvado sejas, meu Senhor
Pelo irmão Vento.
Pelo ar, nublado
Ou sereno, e todo o tempo
Pelo qual às tuas criaturas dás sustento.
Louvado sejas, meu Senhor
Pela irmã Água
Que é muito útil e humilde
E preciosa e casta.
Louvado sejas, meu Senhor
Pelo irmão Fogo
Pelo qual iluminas a noite
E ele é belo e jovial
E vigoroso e forte
Louvado sejas, meu Senhor
Por nossa irmã, a mãe Terra
Que nos sustenta e governa
E produz frutos diversos
E coloridas flores e ervas.
S. Francisco de Assis

4 comentários:

andarilho disse...

volto a partilhar estes textos de tempos atrás... recordações da minha peregrinação a Assis...

Maria-Portugal disse...

que bom...obrigada
atenua certas angústias q já tão perto sinto!

andarilho disse...

Sim... e vou dando conta o quanto tenho perdido aquilo que ainda existia em mim desse espírito deespreendido e franciscano abraçado ao da trapa... muitas saudades mesmos... quantas "tentações" de regressar e ali voltar a abraçar o silêncio que tanta falta e sede me faz...

mas tantos tb a precisarem de uma palavra... um gesto... um abraço neste caminho do mundo...

que o Pai me ampare e ajude a ter forças e coragem para seguir adiante... na missão que semeia o amor... ainda que tão fragilizado pelos nossos barros... o que nos vale é o TESOURO que nele carregamos... não fora isso... meu Deus...

Santo dia...

Ana Loura disse...

Gosto tanto deste teu texto. A lembrar tempos passados, teus e nossos. Beijo