*** Sanctus...Sanctus...Sanctus *** E é importante apoiar-se numa comunidade ,mesmo que seja virtual,porque entre aqueles e aquelas que a compõem,encontram-se os que estão nos tempos em que o dia vai ganhando, pouco a pouco, à noite. Irm.Silencio

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Que é o homem?...



Queres saber o que vale o homem, visto em si próprio?

Sobe ao alto de uma montanha. Olha a cidade dos homens, a teus pés. Não consegues vislumbrá-lo! Não é de certa distância que se apreciam as obras de arte?...

O homem julga-se poderoso, rei e senhor. Em si próprio, nada é; olhado à distância, progressivamente desaparece.

Há tempos, num retiro espiritual, num santuário situado no alto da montanha, fui posto a contemplar a realidade do homem: seu princípio e seu fim, seu valor como criatura de Deus, como filho do Pai celeste, irmão de Cristo e feito ele próprio outro Cristo, pelo amor de Deus para com os homens.

Encontrei aí o homem verdadeiramente livre, sacerdote, em Cristo e por Ele; ainda, rei e profeta.
Encontrei-o aí “feito Deus”, na medida em que, libertando-se do seu egoísmo, do seu individualismo, se une a Cristo e com Ele se identifica numa plena entrega de amor recíproco, levando com Ele e por Ele ao Pai a oferenda da sua vida neste mundo; toda a sua vida, e através dela o Universo inteiro - que recebeu para dominar, e conduzir, em retorno, à glória de Deus.

Mas o homem egocêntrico, egoísta, orgulhoso de um poder que lhe não pertence, vaidoso da sua inteligência... Esse, tentei perscrutá-lo lá de cima, nas entranhas da sua cidade. Ele existia nela aos milhares; vagueava pelas ruas e pelas praças, mas não o pude enxergar, tão pequenino que era. Em contrapartida, que vista maravilhosa, que beleza, em todo o horizonte circundante, nos apresentava a obra da Criação!...
Experimenta! Sobe ao alto de uma montanha. A teus olhos estupefactos, maravilhados, vai crescendo a obra do Senhor, vai-se abrindo ao teu conhecimento a Sua sabedoria infinita, e vai desaparecendo da tua vista o homem, na sua pequenez progressiva, até se tornar irreconhecível! Já Saint-Exupéry o tinha notado, nas suas maravilhosas considerações literárias sobre o Homem.

Leste ou ouviste o que os astronautas, nos seus voos espaciais, deixam escapar de assombro pelas maravilhas que lá do espaço, extasiados, admiram? Mas ao homem, nem por sombras se referem.
Contudo, é este homem que ambiciona dominar os outros homens, que faz as guerras, que mata e que atraiçoa – qual vírus de terrível doença que ataca e tenta destruir a humanidade.
O homem, feito à imagem e semelhança de Deus, e para Ele criado, recebeu d’Ele um mandato. Mas não é escravo, é livre! – é verdadeiramente filho de Deus Criador. Ele vive a sua existência no amor de Deus. A sua vida, produto do Amor, tem de produzir amor – no sentido horizontal, para com os seus irmãos e no domínio das coisas criadas; no sentido vertical, para Cristo, onde tudo se reúne: o Universo físico, vital e espiritual, e a Divindade eterna.

Quão grande é o homem assim encarado, visto na sua autêntica dimensão mística e universal; quão grande é o homem que consciente do seu valor e da sua qualidade de filho adoptivo de Deus, orienta a sua vida para esse “Sol” que lhe deu o ser e que continuamente o ilumina; quão grande é a sua liberdade, sem quaisquer pressões ou peias a forçar ou a impedir o seu caminho!... Unido aos seus irmãos e a Cristo ressuscitado, está de passagem (Páscoa) nesta vida, e dela parte para o Eterno, onde o espera o “Alfa e o Ómega” de toda a Natureza criada.

Mas que infinitamente pequeno é aquela aberração de homem que julgando-se por si próprio deus e fazendo-se centro de todas as coisas, se aniquila e arrasta os outros ao mesmo caos!... Quantos homens na História se proclamaram “deuses” e senhores... e mais não se tornaram, no fim da vida, do que pó da terra, deixando no mundo um rasto de destruição e morte! Podem ter o seu nome escrito nos anais da História, mas é pela negativa que são lembrados.

Que homem queres ser tu, meu amigo?
O que sobe às alturas celestes e ilumina o mundo com o exemplo da sua vida, ou o que se reduz ao nada, na raiva da impotência e da ignomínia?
O que ajuda este mundo a transformar-se na virtude e no bem para glória do Criador, ou o que fechado no seu próprio interesse apenas se serve do mundo, e o leva à destruição?
O que se une por amor aos seus irmãos e com eles edifica a família e a comunidade em que vive, ou o que, impregnado de virulento ódio e de mesquinho egoísmo, explora os outros homens, despreza as suas enfermidades e carências, escraviza-os na injustiça, e os repele para a morte?

Operário ou patrão, professor ou aluno, pai ou filho, marido ou esposa, clérigo ou leigo, rico ou pobre, chefe ou subordinado... A tua vida é sagrada e a tua missão insubstituível. Faz delas o teu sacerdócio permanente, na humildade e no respeito pelos outros; na caridade e na justiça; na verdade e na liberdade. Formamos todos um só Corpo, Místico, de que Jesus Cristo é a cabeça e nós os membros. Toda a nossa vida é culto a Deus, nada – nem um só cabelo da nossa cabeça – é perdido. Não estejas só à espera da hora litúrgica, cerimonial, para O louvares no templo. Esse é um momento particular, mas tu mesmo és templo, porque Deus habita em ti, ainda que o pressintas distante. Deus chama-te hipócrita, como pelo Seu Verbo incarnado fustigou os fariseus, se fores orar para o templo e te negares ao culto permanente da tua vida. Atraiçoas a tua missão sacerdotal, comum a todos os que se dizem cristãos, se não fizeres da tua vida um cântico de louvor ao Deus que te criou!

Ouve-me, de homem para homem. Estamos a sós. Não deixes que as más inclinações invadam e dominem a tua alma, forcem ou impeçam as tuas decisões. És adulto, e és livre! Não te acorrentes às paixões! Não permitas que o egoísmo, o ódio, o despeito, a angústia te torturem.
Deito-te as mãos aos ombros e abano-te... Acorda! Acorda para a realidade que tu és, e olha para o que poderás vir a ser, para o que deves ser, para o que te realiza como pessoa, e, unicamente, te poderá fazer feliz. Encontra-te a ti mesmo, sempre à frente de ti próprio... A meta da perfeição situa-se sempre mais alto e mais além, e perde-se nos horizontes eternos.

Não te importes com o que dizem os outros... Perdoa-lhes, se te molestam; não faças caso, se te louvam. Só Deus conhece e aprecia o teu interior mais profundo. Melhor do que tu, e sempre antes de ti.
Quem está unido a Cristo, deve estar sempre disposto ao sacrifício. Ele foi coroado rei, mas puseram-lhe na cabeça uma coroa de espinhos. Não há amor sem doação; não há renovação sem a rejeição do que não presta. O vinho novo, vivificante, requer odres novos – diz o Senhor.

Dá-me a tua mão. Vamos tentar os dois. Passo a passo, caminhada em caminhada, de escolho em escolho... Se cairmos, levantar-nos-emos, com ajuda mútua. Que importa que sangrem os pés? Venceremos, e haveremos de levar outros pela mão.

V. S.
Sameiro, Braga, Nov 1972
O homem, só se realiza como tal, peregrinando,
em busca do Ressuscitado;
o Ressuscitado, é Aquele que foi crucificado.

2 comentários:

andarilho disse...

O Homem é apenas um filho… amado e abraçado diariamente mesmo nos seus barros… é desses barros que o Pai faz Vasos Sagrados para neles guardar o Seu TESOURO…

E a única “meta” da “perfeição” é saber AMAR… “amar ao próximo como a si mesmo e amar a Deus sobre todas as coisas…!

Isso lhe basta… o resto, só a Misericórdia de Deus… aquele que Nele descansa sabe que “Tudo pode N’Aquele que lhe dá força”….

Abraços fraternos a si e a todo o seu lar VS

Víctor Sierra disse...

Grato, irmão "Andarilho",
Este texto é muito antigo. Foi, a seu tempo, publicado no boletim "Margens do Coura", da paróquia de Vilar de Mouros, cujo pároco tinha sido capelão do meu Batalhão em Angola. Tinha eu, nesta altura, acabado mais uma comissão militar, em Moçambique. Rebuscando os meus papéis, encontrei-o, e achei-o actualizado, com um ou outro pequeno acerto. E aqui o partilho.
Isto prende-se, ao fim e ao cabo, com o problema do "pecado original", ou seja, essa tensão na natureza humana entre o que seduz o homem a querer ser "deus" de si próprio (o homem que deixa de se ver...) - ..."tentação do Paraíso" -, e o homem que se reconhece "nada" fora da intimidade com o seu Criador, e só n'Ele encontra a sua plenitude.
Sócrates (o autêntico...) dizia: "Eu só sei que nada sei"; e o homem só consegue ser Homem na medida da sua humildade, em reconhecer que "nada é" por si mesmo.
Felicidades, para a U. Católica! "Mais alto e mais além!", irmão. Abraço.