*** Sanctus...Sanctus...Sanctus *** E é importante apoiar-se numa comunidade ,mesmo que seja virtual,porque entre aqueles e aquelas que a compõem,encontram-se os que estão nos tempos em que o dia vai ganhando, pouco a pouco, à noite. Irm.Silencio

terça-feira, 31 de julho de 2012

Por que ser cristão ainda hoje?


Partilho aqui uma entrevista de 2006 ao Teólogo Andrés Torres Queiruga que alguns de nós já conhecemos! Achei este material muito rico e forte! Desafio-vos a aprofundá-lo depois no vosso coração!

Por que ser cristão ainda hoje? Quais as razões de ainda ser cristão numa sociedade mediada pela técnica e pela ciência, ante a secularização que é característica da pós-modernidade?

Andrés Queiruga - No fundo, pelas mesmas razões de sempre. É todo o nosso ser que clama pela Transcendência. Há épocas que o tornam mais difícil: épocas de “eclipse de Deus”, como disse Martin Buber (não de “silêncio de Deus”, como se diz às vezes com demasiada alegria e pouco respeito por seu amor incondicional!). A secularização aponta a um desses eclipses. Porém não é um eclipse total. O que nos pede é um esforço por reencontrar e repensar Deus na nova circunstância, primeiro em nós, os e as crentes; e logo, para saber poder anunciá-lo de maneira crível aos demais. Morreu um cristianismo pré-moderno. Porém diante de nós está todo o futuro de Deus, se soubermos ser fiéis aos novos apelos.

Por que crer em Jesus? Quais os seus argumentos para a fé, nos dias atuais, no Deus uno e trino, na ressurreição e na segunda vinda de Cristo?

Andrés Queiruga - Cremos, ou, concretizando, creio pessoalmente em Jesus, porque nele encontro expressa em palavra e, sobretudo em obra e vida, essa abertura fundamental à presença de Deus. Jesus não foi, por sorte, o único na história humana em expressar essa Presença. Mas é aquele em quem encontro a maior e, em definitivo, insuperável manifestação do que nosso coração e nossa história estão buscando. Porque ele nos abriu o Mistério definitivo: o de um Deus que ama sem reservas – bons e maus! - e perdoa sem condições. Um Deus que, entregando-se em seu amor salvador, faz-nos viver de sua vida e de seu Espírito, fazendo-nos filhos e filhas no Filho. Por isso, em Jesus compreendemos de maneira plena e integral o que, em seu amor de Abbá, Deus estava realizando desde o começo da humanidade: que Ele não nos deixa cair na morte, que nos ressuscita. A segunda vinda de Cristo é assim um símbolo da esperança final: ressuscitando-nos a todos, no final, quando acabar o tempo – não sabemos como – nos encontraremos reunidos na grande família de filhos com o Filho. Então, segundo a magnífica visão de são Paulo, Deus “será tudo em todos”.

Em que medida os valores do cristianismo nos ajudam a conviver melhor com os outros seres humanos, com os animais e com a sociedade em que vivemos?

Andrés Queiruga - Só podemos levar a sério a nossa filiação, só creremos sem hipocrisia em Deus como Pai/Mãe, se vermos e tratarmos os demais como irmãos e irmãs. E não “de palavra e de boca, senão com obras e em verdade”. De fato, esta intuição, inclusive oculta e bastante deformada pelos defeitos da cristandade, fecundou a história, como apareceu nos ideais da revolução francesa: liberdade, igualdade, fraternidade. O que se nos pede hoje, insistindo principalmente na fraternidade, é encarnar este ideal – que confessamos em teoria – numa práxis conseqüente que busque alcançar os excluídos e marginalizados. E, se à idéia de criação por amor unirmos hoje a consciência evolutiva, compreenderemos que a criação é universal: somos constitutivamente solidários de todo o cosmo, desde o último átomo ao animal mais elevado. Nela vivemos e vamos construindo a nossa vida. Toda a criação é nosso “corpo”: somos graças a ela e ela alcança em nós a consciência, a liberdade e o amor. Isso, se se quer, é antropocentrismo. Porém antropocentrismo solidário e fraternal. Não é preciso igualar tudo ou ignorar que a humanidade é a “flor da evolução”, para compreender que, justamente por isto, devemos olhar com profundo agradecimento, respeito e amor todas e cada uma das criaturas.

Fé e razão são incompatíveis ou complementares? Como podem os ensinamentos de Jesus conviver com o discurso da ciência?

Andrés Queiruga - Fé e razão são dois modos ou intencionalidades distintas de nossa relação com o mundo, com o único e idêntico mundo. São visões complementares, pois respondem a distintas necessidades da mesma humanidade. O processo cultural pôs a descoberto sua diferença. Porém somente uma má interpretação pode traduzir a diferença por antagonismo. Estamos hoje em condições de compreender que a diferenciação cultural é um ganho para todos, desde que renuncie ao imperialismo da própria visão, evitando invadir as competências alheias. A Igreja teve que aprendê-lo duramente, quando, a partir de uma falsa leitura da Bíblia, invadiu o terreno da ciência. Hoje também a ciência deve aprender a lição: também ela não deve invadir o terreno da religião (nem o da filosofia). Com relação ao princípio e à lucidez histórica, a batalha da justa compreensão está ganha. Mas, na prática, nem todos a compreenderam ainda. Karl Rahner fez a advertência de que convivemos com pessoas que estacionaram no século 19. Se o dizia aos teólogos, vale igualmente para os cientistas. Controvérsias como as do Criacionismo vs. Evolucionismo são, neste sentido, um espetáculo triste... e anacrônico. Eles agem com positivismos cientificistas indignos da ciência atual e com literalismos fundamentalistas que são uma vergonha para a teologia.

Qual é a interferência de Paulo de Tarso nos ensinamentos transmitidos por Jesus Cristo?

Andrés Queiruga - Paulo não tratou diretamente com Jesus de Nazaré. Isso lhe permitiu meditar teologicamente sobre o significado de sua vida e de sua mensagem. Isso lhe permitiu igualmente explicitar aspectos e abrir profundidades que antes não se haviam percebido com clareza. Como dizia Blondel, no que se vive imediatamente – no l’implicit vecu – há sempre riquezas que não se percebem nem podem fazer-se conscientes de imediato. Junto com outros autores do Novo Testamento, Paulo foi um grande explicitador e um eficaz organizador. Porém, como em todo o humano, também isso teve seu preço: concentrou sua teologia no final da vida de Jesus. Ademais, interpretou sua morte-ressurreição de uma maneira excessivamente pontual e sacrifical. Isso pode levar ao mal-entendido de converter numa espécie de ato cúltico (realizado na Cruz, para reconciliar-nos com Deus) tudo o que em Jesus foi o processo e o exemplo de sua vida inteira, de sua atividade e de sua palavra. É preciso superar esse perigo de unilateralidade, completando a profundeza da morte-ressurreição com uma dialética integradora que recupere toda a riqueza da vida de Jesus, pois é ela que lhe dá fundamento e sentido. De fato, foi isso que, no fundo, levou a escrever os Evangelhos que, por isso, têm o caráter de uma biografia – embora seja no estilo de então – que ensina ser seu inteiro destino o que constitui tanto a revelação de Deus, como o modelo integral da vida cristã.

Quais são os maiores desafios do cristianismo no século XXI?

Andrés Queiruga - Do ponto de vista teórico, o desafio é repensar todos os grandes temas da teologia, ultrapassando fundamentalismos e tradicionalismos, e recuperar seu significado para a vida cristã. Já do olhar eclesial, é desafiador democratizar profundamente o governo da Igreja, superando toda discriminação interna – sobretudo, a da mulher – e eliminando o autoritarismo, em direção a uma comunidade inclusive “mais que democrática”. Isso o quis e o mandou Jesus de maneira explícita: “Sabeis que os chefes das nações as dominam como senhores absolutos, e os grandes as oprimem com seu poder. Não há-de ser assim entre vós, senão que, quem queira ser grande entre vós, será vosso servidor, e quem queria ser o primeiro entre vós, será vosso escravo”. Com relação à missão no mundo, o desafio é gerar sentido e esperança, mostrando-o principalmente no serviço comprometido com os mais pobres e abrindo-se, com generosidade fraternal, ao diálogo e à colaboração com as demais religiões.

2 comentários:

vp disse...

Santa tarde...

O encontro correu bastante bem com o Irmão que manda abraços a todos e está unido em comunhão na oração! Falta só acertar alguns detalhes e datas, mas está muito próximo o caminho... orem por tudo...

Melhoras aos enfermos e bom tempo de férias e de descanso...

Nele que nos ama infinitamente...

Ana Loura disse...

Obrigada por mais esta partilha. Para ler com atenção.
Quanto ao teu caminho, oro sim. Abraços fraternos para ti e Irmão